NOVAS CARACTERISTICAS DO PROFESSOR
quarta-feira, 30 de dezembro de 2009 by Reciclagem de Artigos in

De acordo com Nóvoa, há quatro tipos de disposições que os professores devem adotar na prática pedagógica: relacionais, organizacionais,reflexivas e deliberativas

Reflexivas – Para ele, a formação reflexiva é a única forma de se reagir a profusão de cursos, seminários, técnicas e novos métodos que são oferecidos hoje aos professores. “A bagagem essencial do professor é seu repertório profissional que é adquirido pela prática. Porém, não é a prática por si só que é formadora, ela deve sempre ser acompanhada da reflexão sobre a experiência,pois é a reflexão sobre a experiência que é formadora e não a experiência por si só”.
Por esse motivo, o terceiro ponto que Nóvoa traz sobre formação de professores, ele designa como a importância de uma formação mútua baseada na compreensão e no diálogo profissional. Esse diálogo pode possibilitar que a formação não seja mais uma exigência, mais uma tarefa para cumprir num dia-a-dia tão carregado, mas que seja um instrumento para o professor, uma maneira de ele compartilhar experiências e encontrar conforto pessoal e, ao mesmo tempo, alguma forma de intervenção no espaço da escola.
Para o educador de Portugal, a necessidade e a cobrança de um professor reflexivo apresentam muitas contradições. A principal é que desde que se começou a falar em professor reflexivo, nos últimos quinze anos, os professores passaram, em regra geral, a ter menos tempo para refletir e isso é uma incoerência, pois a matéria prima do professor reflexivo é o tempo. “Sem tempo não há reflexão nem professor reflexivo. É uma contradição impressionante que justamente quando se fala mais de professor reflexivo, ele tenha menos tempo de exercer essa sua capacidade”, diz.
De acordo com Nóvoa, nada disso tem sentido se as mudanças teóricas não vierem acompanhadas de uma mudança concreta das escolas, “da logística, da organização das escolas, da organização dos horários dos professores, das condições de trabalho do professor”, diz.
Deliberativas – Segundo o professor da Universidade de Lisboa, este conceito é um contraponto a outros conceitos que têm sido utilizados para definir o trabalho dos professores, não como ode meros transmissores, mas como transformadores de conhecimento. O educador cita dois conceitos importantes: transposição didática (de Yves Chevallard) e transposição pragmática (de Phillipe Perrenoud) que estão presentes no discurso educativo para explicar a função da escola e dos professores. O conceito de transposição didática trata da idéia da transposição do conhecimento científico em conhecimento escolar. Já o conceito de transposição pragmática, trazido por Perrenoud, acrescenta a esse processo de transposição o confronto enfrentado pelos professores na sua prática, como a imprevisibilidade do fazer pedagógico, gerado pela necessidade desse em encontrar soluções rápidas e práticas no espaço pedagógico. Nóvoa propõe um terceiro conceito importante
para se pensar na formação, definido por ele por conceito de transposição deliberativa que reforça a idéia de que os professores precisam ser capazes de conhecer e de trabalhar o aspecto cultural e outros aspectos do domínio da ética e dos valores. Para ele, o que define o trabalho do professor não é só a transposição dos saberes, como proposto por Chevallard, e não só a mobilização prática desses saberes em contexto pedagógico, como propõe Perrenoud, mas a junção dessas duas coisas numa terceira dimensão: a dimensão ética, cultural e de valores. Ele afirma que algumas das pesquisas mais interessantes dos últimos tempos na área das neurociências. “A neurociência, com certeza, é a ciência que mais se desenvolveu na última década.” Segundo Nóvoa, muitos resultados dos estudos sobre o cérebro e sobre a aprendizagem contrariam o que os educadores acreditavam e que era convicção pedagógica na virada do século XIX e início do século XX. “Nem sempre se aprende do mais simples para o mais complexo, nem do mais complexo para o mais abstrato, nem sempre se aprende através da razão, muitas vezes se aprende através da emoção, da sensibilidade.” Isto, de acordo com o educador, coloca em xeque um conjunto de pressupostos fundadores das pedagogias e o professor precisa ser preparado para os desafios que surgem através das novas pesquisas científicas. Para concluir, ele faz um apelo aos professores e as autoridades que determinam os planos educacionais: “não embarquem na primeira moda, não acreditem em tudo que lhes tentam vender, só acreditem naquilo que é discutido e construído com os colegas”. Nóvoa fez também um apelo para que os educadores mantenham um diálogo aberto entre si. “Partilhemos nossas dúvidas, nossas angústias, nossas críticas e aflições, pois se é o diálogo que nos mantém vivos, como dizia Paulo Freire, é o diálogo com os colegas que nos faz professores. Esta pode ser a mais difícil, mas é, com certeza, a mais necessária das profissões. Não vale a pena acreditar que podemos transformar tudo. Não podemos. Não vamos conseguir criar uma escola que vai salvar a sociedade. Mas quem é professor não deixa nunca de acreditar, sabe que renunciar às ilusões não quer dizer renunciar às diferenças. Significa nunca deixar de ter esperança tempos foram
Nóvoa aponta que tem havido uma tendência excessiva à culturas infantis, o que define por infantilização da escola, que vem carregada de um objetivo louvável – o de conquistar os alunos e tentar encontrar dinâmicas de motivação mas que traz um problema, pois o que era uma estratégia de ensino, muitas vezes, se transforma no conteúdo do trabalho. Sobre isso, Costumamos dizer que a pedagogia está entalada entre duas matrizes, a psicológica e a sociológica. A matriz pedagógica do século XX foi baseada na idéia de motivação e sedução, na qual o essencial do trabalho do professor era seduzir o aluno para que ele fizesse por vontade própria aquilo que o professor queria. A pedagogia era um jogo de seduções. Até aqui, a pedagogia foi baseada muito nesse jogo de motivações e suposições o que levou a introdução de questões lúdicas primárias como os jogos Montessori, o material Decroly, um conjunto de coisas que foi se fazendo no início do século XX que tinha como essência fazer experiências, métodos, teses para colocar em prática essa dinâmica de motivação ou de sedução. Nessa perspectiva não tenho absolutamente nada contra o jogo e a atividade lúdica. O problema é que nos últimos 20, 30 anos muitas dessas iniciativas deixaram de ser uma estratégia para colocar os alunos em situação de aprendizagem e passaram a ser a essência da escola, que passou a ter, sobretudo, uma função de entretenimento ou de guarda das crianças. A única tese que permite explicar que uma criança, um jovem de quinze anos, que esteve durante nove anos, seis horas por dia, dentro de uma escola e chegou ao fim desse período não sabendo rigorosamente nada, demonstra uma espécie de renúncia de todos os adultos que passaram por ele neste período. Refiro-me à escola e à falta de apoio da família e da sociedade. Hoje, vivemos na pedagogia uma situação que não é meramente de motivação e sedução, mas é o que se pode definir como necessidade de Ressignificar a escola. Isso se faz necessário principalmente nessa época em que o diploma escolar não serve para nada. Essa foi uma das grandes mentiras do século XX, um dos grandes enganos.
Uma armadilha para as classes populares foi dizer que se fizessem grande esforço para ter o diploma escolar, teriam uma vida melhor. Há uma necessidade de Ressignificar o capital e o sentido da escola, pois temos dificuldade em lidar com as crianças. Os professores não são super homens. Há uma dimensão da consciência, do compromisso profissional, que é central em sua fala o educador aponta algo contraditório hoje na educação, designado por ele como a comunitarização da escola – a idéia de que a escola seja o lugar onde se vai trabalhar os laços afetivos, os laços de comunidade, a criação de um espaço vivo e de convivência. Sobre isso diz: “É um debate difícil, pois toca nas crenças existentes no discurso comunitarista sobre a escola. Quem diz que a escola deve estar inserida na comunidade, deve responder às diferenças sociais e culturais, não tem o direito de impor uma cultura, de impor uma forma, deve respeitar as diversas religiões, comportamentos, hábitos. Com esse discurso foi-se perdendo a essência da escola: na escola, os alunos devem aprender as regras sociais e, mais ,importante, devem construir uma cultura comum partilhada. É preciso respeitar as culturas construídas, a diversidade cultural, mas a escola pública só faz sentido se for para valorizar a idéia de uma cultura comum compartilhada. Não uma cultura monolítica ou uma cultura dominante. Do contrário, é melhor que cada comunidade tenha sua escola, cada religião tenha sua escola, cada classe social tenha sua escola. A escola pública toma sentido numa dimensão da aprendizagem das regras de vida em sociedade e do dialogo como um bem Público essencial.” Sobre a questão do modismo na educação, apontada por ele, sobre as novas tendências, em especial o construtivismo, ele diz: “Tenho tendência a olhar do ponto de vista pragmático para a realidade e pensar como é que naquela escola os professores estão organizados, como é que a direção articula ou não com os professores, se há ali alguma coerência no funcionamento. Prefiro olhar para a realidade concreta e ela nos mostra que não há uma prática pedagógica pura, que corresponda a teoria X ou Y.
A prática pedagógica tem relação com experiência de vida e, acima de tudo, com a experiência profissional dos professores. Ela tem relação com a maneira como o professor incorporou e se apropriou de um conjunto de experiências e de ações concretas sobre situações concretas, e como essas coisas se misturam num contexto social e histórico para dar origem à uma determinada realidade. É necessário os professores terem lucidez para serem capazes de ir buscar o que funciona no seu próprio percurso e na sua própria maneira de ser professor e não queiram aderir a práticas porque agora é moda usar isso. A melhor pedagogia é aquela que cola na pele e casa com a sensibilidade do professor. Precisa ver se ela aparenta ter uma maior coerência, uma maior consistência do ponto de vista profissional. Só assim vai valer a pena a prática pedagógica.